Passou os anos de infância de forma despreocupada e livre numa Lisboa onde, como canta Carlos do Carmo, os rapazes parecem bandos de pardais á solta, e assim cresceu feliz.
Na escola primária do Dafundo, fez a 4ª classe, matriculando-se depois no curso de serralheiro mecânico da Escola Industrial do Marquês de Pombal, onde iria ter um grupo docente de artistas que viriam a ter um papel determinante na iniciação da sua futura profissão.
Foi o pai que lhe introduziu o gosto pelo cheiro das tintas e o barulho das máquinas de impressão tipográfica do Jornal onde trabalhava. É assim que tem os primeiros contactos com as artes gráficas.
Em 1945, Sebastião Rodrigues começa a trabalhar para o atelier APA (Agência de Publicidade Artística), tendo como chefe gráfico Alberto Cardoso e como companheiro mais velho de ofício Manuel Rodrigues. Este último iria orientá-lo na sua evolução como artista gráfico, que passa pela pesquisa e descoberta das técnicas gráficas e pelo apurar da sua linguagem plástica.
José Cardoso Pires, seu amigo e cúmplice desse espírito criativo, descrevia-o como "Gato". Na verdade, era esguio e discreto como um gato de segredos, sensível, avisadíssimo. Criatura de gestos sóbrios, olhar rápido. Uma inteligência felina e um humor muito privado, quase escondido. Enfim um "gato". É sendo assim que sobrevive mais de quarenta anos, num estado onde o sentido democrático tropeça com as almas criativas.
O trabalho do artista gráfico passou inicialmente pela realização de cartazes, folhetos e montras, numa altura em que fazia tarefas de designer gráfico mesmo antes de o termo existir. Foi-se tornando conhecedor como poucos de todo o processo tipográfico e, mais tarde, da impressão em offset. Assim, desenvolveu laços de trabalho e amizade com impressores, compositores gráficos, montadores e retocadores que o ajudaram na concretização dos seus projectos. Com eles aprendeu os segredos que só estão ao alcance dos mais audazes, técnicas que lhe permitiram interpretar e tornar em imagens impressas projectos de grande qualidade e ambição técnica. João Gonçalves, um dos melhores fotógrafos gráficos do seu tempo, é um desses casos. Com ele aprendeu a analisar uma imagem através da selecção de cor.
Tecnicamente, estávamos ainda longe dos meios informáticos dos nossos dias, mas Sebastião Rodrigues assistiu à mudança tecnológica e alertava para os seus perigos e equívocos, com consequências imprevistas para o futuro, para a dependência desses meios em virtude do nosso pc portátil ter mais capacidade que é o cérebro humano.
Sebastião Rodrigues inspirou-se, por exemplo, nos caracteres egípcios, na caligrafia clássica, onde só se utilizavam as letras maiúsculas, no folclore (costumes) nacional e no artesanato. A par destas influências, encontramos inspiração nas correntes artísticas vigentes na primeira metade do Séc. XX: o Cubismo, o Dadaismo, o Surrealismo e, como não poderia deixar de ser, a linguagem moderna, limpa, polida e sem artifícios do Modernismo. Esta última é a mais importante fonte de inspiração na sua obra.
Lembrar Sebastião Rodrigues é evocar a profissão de Designer, ou melhor, a antiga profissão de artista gráfico. E isso é tanto mais importante quando compreendemos o seu percurso e a sua obra para entendermos como foi conseguida à base do rigor e de muito trabalho prático. Foram horas a fio a fazer cores, a escolher papéis, a fotografar, a recortar, a colar, a desenhar letras, a decalcar letras, tudo passos que, no design dos nossos dias, foram substituídos por ferramentas informatizadas, que tornam muitas vezes o tarefa do designer impessoal, computorizada, sem se perceber a origem e o porquê das coisas. Com efeito, hoje o e-mail substituiu o contacto com os técnicos da gráfica, algo que impede o antigo sentir o cheiro das tintas.
A sua obra é vasta, cheia de referências para os novos designers, marcante para quem de perto contactou com ela. Recordo com satisfação os meus tempos de estudante, as minhas visitas à Fundação Calouste de Gulbenkian, e a impressão que me causou a consolidação da marca Gulbenkian através do bilhete do catálogo dos cartazes das obras mais emblemáticas. E, tudo isto, da responsabilidade de Sebastião Rodrigues.
Prof. Joaquim Varanda
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